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Número da edição 34.1 Outros conteúdos científicos

Aplicação da biomodulação por fluorescência em doenças cutâneas

Publicado 10/07/2024

Escrito por Neoklis Apostolopoulos

Disponível em Français , Deutsch , Italiano , Español e English

A preocupação com o aumento da resistência bacteriana aos antibióticos levou os clínicos a procurar novas alternativas para doenças de pele como a piodermite. O presente artigo analisa as possibilidades de um desses tratamentos, a saber: a fotobiomodulação.

Piodermite

Pontos-chave

A biomodulação por fluorescência é um tipo de terapia a laser, e os resultados iniciais em cães com diversos distúrbios cutâneos são promissores.


Os estudos demonstraram que a biomodulação por fluorescência reduz as citocinas pró-inflamatórias e aumenta as citocinas anti-inflamatórias na pele.


A biomodulação por fluorescência, em conjunto com antibióticos sistêmicos, pode não só acelerar a melhora em cães com piodermite, mas também ser útil no tratamento de outras condições, como fístulas perianais e otite externa.


Embora a biomodulação por fluorescência seja uma técnica segura e pareça ter uma boa eficácia antibacteriana, seu mecanismo exato de ação permanece desconhecido.


Introdução

A biomodulação por fluorescência (também conhecida como fotobiomodulação e biomodulação fluorescente) é um tipo de terapia a laser de baixa intensidade – que, atualmente, está ganhando popularidade como uma opção viável para o tratamento de algumas afecções na medicina veterinária. Em geral, os métodos de terapia a laser de baixa intensidade costumam empregar fótons de vários comprimentos de onda e operar em níveis de radiação não térmicos de modo a ativar processos biológicos 1. Para fazer isso, a luz deve ser capaz de penetrar nos tecidos, e a profundidade de penetração é ditada pelo comprimento de onda da luz. A pele contém uma variedade de cromóforos endógenos (moléculas que absorvem fótons em determinados comprimentos de onda), e os mais comuns são a hemoglobina e a melanina; cada um tem coeficientes de dispersão e absorção distintos que dependem significativamente do comprimento de onda da luz 2. Portanto, a escolha do comprimento de onda é considerada um dos fatores mais importantes na terapia a laser de baixa intensidade. Com o sistema de biomodulação por fluorescência, emprega-se uma luz LED azul (Figura 1) para ativar o substrato – que, no caso, consiste em um gel fotoconversor contendo cromóforos (Figura 2). Os cromóforos ativados liberam energia na forma de luz fluorescente, a qual penetra na pele do paciente; a profundidade de penetração varia, dependendo do perfil do espectro emitido 2. A luz no espectro azul a verde tem uma profundidade de penetração de cerca de 1-2,5 mm na pele, afetando principalmente a epiderme e a camada superior da derme. A luz vermelha pode penetrar quase 5 mm na pele, atingindo as camadas profundas da derme e, possivelmente, chegando até ao panículo 2. Este breve artigo fornece uma visão geral sobre o uso da terapia de biomodulação por fluorescência para algumas doenças de pele frequentes na clínica veterinária.

lâmpada LED azul disponível na pele de cão

Figura 1. Um exemplo de lâmpada LED azul disponível no mercado, utilizada para a biomodulação por fluorescência.

© Neoklis Apostolopoulos

Líquido laranja em um pequeno recipiente

Figura 2. Gel fotoconversor misturado com cromóforos (líquido laranja), disponível no mercado, aplicado na área a ser tratada.

© Neoklis Apostolopoulos

Biomodulação por fluorescência em medicina veterinária

A biomodulação por fluorescência foi originalmente utilizada na medicina humana e, agora, também é empregada na medicina veterinária para tratar vários distúrbios dermatológicos – que, inclusive, são um dos principais motivos de consulta ao médico-veterinário 3. Em muitos países, já existe pelos menos um sistema de biomodulação disponível no mercado para uso na clínica veterinária. O tratamento é de curta duração, indolor e, geralmente, pode ser realizado sem sedação. O processo é simples: a área a ser tratada é primeiramente submetida à tricotomia (se necessária) e, depois, limpa com solução salina estéril. Depois, aplica-se o gel cromóforo com uma espátula, formando uma camada de aproximadamente 2 mm de espessura. Em seguida, ilumina-se a pele com a lâmpada LED por dois minutos. Estudos demonstraram que a biomodulação por fluorescência reduz as citocinas pró-inflamatórias e aumenta as citocinas anti-inflamatórias. Também demonstraram que, após o tratamento com biomodulação por fluorescência, ocorre um aumento de fatores de crescimento importantes para a proliferação de novo tecido de granulação, o processo de angiogênese e a remodelação de colágeno – que, juntos, promovem a cicatrização completa de feridas 1,2,4

Piodermite

Os resultados da biomodulação por fluorescência em cães com foliculite bacteriana superficial 5 ou piodermite profunda 6 são promissores. Estudos demonstraram que a técnica é segura e pode ser usada juntamente com antibióticos sistêmicos para acelerar o tratamento da piodermite canina. Para os casos de piodermite superficial, pode-se considerar o uso da biomodulação por fluorescência como tratamento único 1,2,5,7, embora haja necessidade de mais estudos para comprovar essa proposta. A Figura 3 mostra a imagem de um cão com piodermite na prega vulvar antes do início do tratamento. A piodermite foi tratada com biomodulação por fluorescência em intervalos semanais (com duas aplicações consecutivas por sessão) durante dois meses, e os efeitos benéficos podem ser observados na Figura 4.

Vulva de um cão com pioderma

Figura 3. Cão com piodermite nas pregas vulvares antes do tratamento. Observe o eritema, a exsudação e a erosão da pele.

© Neoklis Apostolopoulos

Pioderma após tratamento com FBM

Figura 4. Mesmo caso da Figura 3, dois meses após o tratamento com biomodulação por fluorescência uma vez por semana (duas aplicações por sessão).

© Neoklis Apostolopoulos

Em um estudo clínico prospectivo, randomizado e cego, avaliou-se a eficácia de um sistema de biomodulação por fluorescência no tratamento de cães com piodermite interdigital. Nesse estudo, um total de 36 cães foram distribuídos aleatoriamente em dois grupos terapêuticos: um sob tratamento exclusivo com antibióticos e outro sob tratamento com antibióticos juntamente com biomodulação por fluorescência (aplicada durante dois minutos, duas vezes por semana, até a resolução clínica). Todos os cães foram avaliados durante um período de 12 semanas, e o tempo médio transcorrido até a resolução das lesões foi de 4,3 semanas para aqueles submetidos a ambas as formas de terapia (i. e., tratamento combinado), em comparação a 10,4 semanas para os outros que receberam apenas antibióticos. Foi concluído que a biomodulação por fluorescência reduziu significativamente o tempo necessário para a resolução clínica 8. Portanto, em cães com piodermite interdigital, pode-se recomendar a aplicação de biomodulação por fluorescência duas vezes por semana 9; embora se possa considerar a redução da frequência para uma vez por semana (com duas aplicações consecutivas na mesma sessão) 10, há necessidade de estudos randomizados de maior escala para validar os dados existentes 9

Embora esses resultados mostrem a eficácia clínica antibacteriana da biomodulação por fluorescência, o mecanismo de ação permanece desconhecido. Dois estudos preliminares in vitro não conseguiram demonstrar a atividade bactericida da biomodulação por fluorescência 11 ou da luz LED azul 12

Otite externa

Em um ensaio clínico randomizado não cego, sugeriu-se que a biomodulação por fluorescência também possa ser benéfica no tratamento da otite externa em cães 13, uma condição comumente responsável por até 20% das consultas na clínica de pequenos animais 14. A aplicação de biomodulação por fluorescência no canal auditivo externo pode modular a inflamação, a dor e o crescimento bacteriano 13 – embora, conforme mencionado anteriormente, estudos in vitro não tenham sido capazes de determinar por qual razão a biomodulação por fluorescência ou a luz LED azul teria atividade bactericida. Em contrapartida, em um estudo preliminar in vitro, demonstrou-se que a biomodulação por fluorescência pode inibir o crescimento de Malassezia pachydermatis após pelo menos quatro minutos de exposição 15.

Condições diversas da pele

Outra aplicação relatada de biomodulação por fluorescência envolve o tratamento de fístulas perianais caninas 16. Nesse estudo, quatro cães com a doença receberam exclusivamente sessões de biomodulação por fluorescência uma vez por semana, com duas aplicações consecutivas em cada sessão. Após duas semanas de tratamento, todos os cães melhoraram, observando-se uma redução significativa na vocalização, no tenesmo e nas lambeduras. Depois de cinco semanas de tratamento, as lesões perianais diminuíram significativamente. Mais uma vez, o mecanismo de ação da biomodulação por fluorescência nesses casos permanece desconhecido. A Figura 5 mostra um caso de fístula perianal canina antes do tratamento com um sistema de biomodulação por fluorescência disponível no mercado, uma vez por semana. Três semanas depois de iniciar o tratamento, houve redução do eritema e melhora da fístula (Figura 6). Por essa razão, sugere-se que a biomodulação por fluorescência possa ser benéfica nesses casos por seus efeitos na cicatrização de feridas 1,2,4

Fístula na região perianal

Figura 5. Cão com fístula perianal antes do tratamento com biomodulação por fluorescência. O paciente foi tratado com essa técnica uma vez por semana (duas aplicações por sessão).

© Amaury Briand

Fístula tratada com FBM

Figura 6. Mesmo caso da Figura 5, três semanas após a primeira sessão.

© Amaury Briand

Vale ressaltar que muitas das condições citadas anteriormente se devem a alguma doença subjacente, como dermatite atópica, reações cutâneas adversas a alimentos, ectoparasitas, endocrinopatias, e problemas de conformação. Sempre que possível, é essencial que a doença subjacente seja identificada com testes diagnósticos adequados (raspados de pele, citologia, exames de sangue, dieta de eliminação, etc.) e tratada da devida forma.

Por fim, foi relatado que a biomodulação por fluorescência auxilia na cicatrização de feridas cirúrgicas agudas não complicadas 4; Foi demonstrado que a terapia de biomodulação por fluorescência estimula a liberação de citocinas promotoras da cicatrização de feridas e melhora as características microscópicas das feridas incisionais. Observou-se uma reepitelização tecidual completa, com melhor deposição de colágeno e menos inflamação da derme. Entretanto, não se observou nenhum efeito no aspecto macroscópico das feridas 4, e ainda são necessários mais estudos para avaliar esses resultados 9.

Neoklis Apostolopoulos

Com a biomodulação por fluorescência, têm-se obtido resultados promissores no tratamento tanto da foliculite bacteriana superficial como da piodermite profunda em cães

Neoklis Apostolopoulos

Considerações finais

Esses resultados tão promissores sugerem que a biomodulação por fluorescência possa ser utilizada no tratamento de diversas doenças dermatológicas caninas, com o potencial de expandir ainda mais suas aplicações na medicina veterinária. Contudo, há necessidade de mais estudos para avaliar a eficácia da modalidade no tratamento de diferentes doenças de pele e determinar o seu mecanismo de ação com precisão.

Referências

  1. Marchegiani A, Spaterna A, Cerquetella M. Current applications and future perspectives of fluorescence light energy biomodulation in veterinary medicine. Vet. Sci. 2021;8:20. https://doi.org/10.3390/VETSCI8020020

  2. Scapagnini G, Marchegiani A, Rossi G, et al. Management of all three phases of wound healing through the induction of fluorescence biomodulation using fluorescence light energy. BiOS. 2019;31. https://doi.org/10.1117/12.2508066

  3. Hill PB, Lo A, Eden CAN, et al. Survey of the prevalence, diagnosis and treatment of dermatological conditions in small animals in general practice. Vet. Rec. 2006;158:533-539. https://doi.org/10.1136/VR.158.16.533 

  4. Salvaggio A, Magi GE, Rossi G, et al. Effect of the topical Klox fluorescence biomodulation system on the healing of canine surgical wounds. Vet. Surg. 2020;49:719-727. https://doi.org/10.1111/VSU.13415

  5. Marchegiani A, Spaterna A, Fruganti A, et al. Exploring fluorescent light energy as management option for canine superficial bacterial folliculitis. Front. Vet. Sci. 2023;10:1155105. https://doi.org/10.3389/fvets.2023.1155105

  6. Marchegiani A, Fruganti A, Spaterna A, et al. The effectiveness of fluorescent light energy as adjunct therapy in canine deep pyoderma: A randomized clinical trial. Vet. Med. Int. 2021;6643416. https://doi.org/10.1155/2021/6643416

  7. Apostolopoulos N, Mayer U. Use of fluorescent light energy for the management of bacterial skin infection associated with canine calcinosis cutis lesions. Vet. Rec. Case Rep. 2020;8:e001285. https://doi.org/10.1136/VETRECCR-2020-001285

  8. Marchegiani A, Spaterna A, Cerquetella M, et al. Fluorescence biomodulation in the management of canine interdigital pyoderma cases: a prospective, single-blinded, randomized and controlled clinical study. Vet. Dermatol. 2019;30:371-e109. https://doi.org/10.1111/VDE.12785

  9. Perego R, Mazzeo M, Spada E, et al. Critically appraised topic on low-level laser therapy (LLLT) in dogs: An advisable treatment for skin diseases? Vet. Sci. 2022;9:505. https://doi.org/10.3390/VETSCI9090505

  10. Marchegiani A, Fruganti A, Gavazza A, et al. Fluorescence biomodulation for canine interdigital furunculosis: updates for once-weekly schedule. Front. Vet. Sci. 2020;9:880349. https://doi.org/10.3389/fvets.2022.880349 

  11. Lundberg A, Hathcock T, Kennis RA, et al. In-vitro activity of fluorescence photobiomodulation therapy on meticillin-susceptible and -resistant Staphylococcus pseudintermedius and S. aureus; NAVDF congress abstracts. In: Vet. Dermatol. 2023;249-265.

  12. Schnedeker AH, Cole LK, Lorch G, et al. In-vitro bactericidal activity of blue light (465 nm) phototherapy on methicillin-susceptible and methicillin-resistant Staphylococcus pseudintermedius. Vet. Dermatol. 2017;28:463-e106. https://doi.org/10.1111/VDE.12451

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  14. Saridomichelakis MN, Farmaki R, Leontides LS, et al. Aetiology of canine otitis externa: a retrospective study of 100 cases. Vet. Dermatol. 2007;18:341-347. https://doi.org/10.1111/J.1365-3164.2007.00619.X

  15. Gil N, Santoro D, Marsella R. In-vitro susceptibility of Malassezia pachydermatis to low-level light therapy; NAVDF congress abstracts. In: Veterinary Dermatology. John Wiley & Sons, Ltd, 2023;249-265

  16. Marchegiani A, Tambella AM, Fruganti A, et al. Management of canine perianal fistula with fluorescence light energy: preliminary findings. Vet. Dermatol. 2020;31:460-e122. https://doi.org/10.1111/VDE.12890

Neoklis Apostolopoulos

Neoklis Apostolopoulos

O Dr. Apostolopoulos obteve seu diploma de médico-veterinário na Universidade de Tessália, na Grécia Leia mais

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